12/12/2007

Vidas Ordinárias IX

João.


Foi no dia 25 de dezembro, morreu com o peru da noite anterior ainda entalado na garganta. A fartura lhe havia sido cara, ou não? Foi num cruzamento, atropelado ainda com o peru no bucho, na manhã seguinte da ceia de natal. Não teve tempo nem de apreciar os restos amanhecidos daquele jantar. Delírios literários. Morreu e ponto. A diferença única daquela morte foi o peru. Que rechonchudo reluzia na mesa, dourado, suculento, indecente de tão grande.

Não era para menos uma morte tão súbita e inesperada. A culpa recaiu sobre a tia que havia insistentemente lhe oferecido mais um prato, um repeteco daquela delicia. Come vai, mais um pedacinho não vai te matar. Mas matou. João está morto e ponto. Foi a gula? Até agora a família se indaga. Se a gula matasse, deveria ter matado antes, bem antes, o tio. Aquele sim merecia morrer tamanha sua gulodice. Sua fome não tinha tamanho. Tinha que ter sempre tudo do bom e do melhor, e bebia e fumava e trepava com a vizinha que todo mundo sabia que dava pro tio. Que era casado, mas sua gula não o deixava parar. Não morreu e está até hoje matando o seu desejo desavergonhado.

Outra possibilidade é que João se suicidara. Morte desejada. O seu presente de natal esse ano tinha sido mais um livro sobre espiritismo, a vida de Allan Kardec, espírito famoso. Não que João fosse espírita, mas achava que, já que as assombrações estão por ai mesmo, melhor saber com quem se está lidando. Pois bem, João pode ter morrido de pena, pena de comer um bicho tão grande e bobo como era o peru. Um bicho que ao se olhar, percebia-se uma alma leviana. E talvez, é apenas uma hipótese, morreu de dó. O danado do bicho não perdoou João e o levou diretamente ao encontro de sua morte. Num cruzamento, logo de manhã, João deu seu último suspiro, lembrando de como foi doce e cruel aquela última ceia. Morreu no delírio da lembrança, mas satisfeito.

28/11/2007

Insônia

Maria passou a noite toda acordada pensando no sol da manhã seguinte. Tinha uma música na cabeça que, neuroticamente, repetia-se: levante as mãos e daí glória a deus... Levante as mãos e daí glória a deus. De repente já era 5:30 da matina, a luz do dia começava a entrar pelas frestas da cortina e agora ela já não podia mais dormir, ouvindo os pássaros, a música incessante na sua cabeça. Levantou-se de um pulo e pensou ela mesma em rezar, poderia rezar qualquer coisa, contanto que a fizesse descansar a mente daquele refrão e poder, pelo menos, cochilar uma hora. Logo já eram sete e meia da manhã, Maria levantou-se, tinha os olhos e os lábios inchados, um peso em suas costas a fazia ficar curvada e sem vontade. Olhou-se no espelho e o que via era um vulto de si mesma. Uma mistura de sono com o desejo de que aquilo passasse por completo. “Não vou agüentar, não vou conseguir.” Tomou uma ducha e enquanto a água caía pelo seu corpo, chorava junto. Um chorinho miúdo, esquecido dentro dela por muito tempo. “Ai que vontade de não ser... De virar água da água e ir pra sempre por esse ralo” Falava em voz alta, depois resmungava qualquer palavra.

Na rua o sol queimava com força seus olhos, Maria sentia sua boca rachando quanto mais andava naquelas calçadas. As pessoas do ponto de ônibus cheiravam a bolo de fubá, o odor do tabaco queimando pairava no ar e de repente ela sentiu um desejo de fumar também. Busca alguém na rua que esteja fumando, lá longe ela vê um daqueles senhores que carregam uma placa no pescoço. Foi até lá “ Moço,o senhor pode me dar um cigarro?” “O fia, só tenho derby, cê fuma?” A simplicidade da oferta daquela pessoa, quase comoveu Maria a ponto de chorar. No pescoço dele tinha uma placa pendurada onde se lia : Seu futuro está em suas mãos. Empréstimos a baixo custo. Ela ascendeu o cigarro, olhou nos olhos tristes daquele velho pobre, pensou que poderia fazer um cheque de duzentos reais e dar pra ele(toma moço, vai comprar uma camisa nova, um livro pra sua filha, um tênis pro seu neto). Por que ela não fez isso então? Por que não doava assim como ele doou seu simples cigarro? Ela já ia dar as costas quando o velho falou pra ela bem assim “ Fia, cê acredita em deus nosso senhor?” “Talvez, não sei bem, acho que sim...Por quê?” “Pega na mão do divino fia, que com ele a gente nunca ta só.” “O que foi que o senhor disse?” “Disse nada não,f ia.” E se virou e foi embora.

Ela teve a certeza de que tinha ouvido aquele senhor pronunciar tais palavras, ou era a insônia, ou ela realmente havia passado por uma experiência religiosa. Quando o procurou com os olhos ele já havia cruzado a avenida e estava descendo por uma rua. Maria teve que sentar, procurou o celular na bolsa, não achou. Ligou a cobrar do orelhão pra sua melhor amiga, a única que poderia acabar de vez com essa hipótese. “Oi Ana, é Maria, escuta, desculpa te ligar, mas eu tenho uma pergunta séria pra te fazer” “ Maria, espero que seja séria mesmo pra ser a cobrar a essa hora da manhã.” Ana não havia deixado sombras de dúvidas que mataria ela ao ouvir sua dúvida. “Ana, preciso saber, você acredita em deus? Digo, pode ser naquela força superior, mas você acredita?” “ Maria, meu amor.” Ana fez um silêncio e quando terminou de pensar, falou “ Deus é coisa de gente apegada, e religião meu amor, é desculpa esfarrapada.!” E desligou o telefone na cara de dela. Neste momento ela realizou que sim, havia solidão no mundo e neste momento, era ela a própria solidão.

O mundo parou a sua volta, o sono tentava entrar pela sua nuca e lutava contra seus olhos. Queria fechá-los, arrancá-los da cara, viver a escuridão eterna daquela noite que ela não dormiu. Sabia que tinha que agüentar até o fim daquele imenso dia insuportável. Tinha que ir trabalhar, sentar no computador, produzir, fazer dinheiro, colaborar com os colegas. “Levante as mãos e daí glória a deus, levante as mãos e daí glória deus...” “Que fazer meu deus?! Meu deus, que deus? Que caralho, cadê o frontal, por favor, moço, um café!” Maria se sentou no boteco e esperou ver se a confusão passava; o frontal pra relaxar, mas o café pra dar uma animada, era como mutilar o cérebro com soda cáustica. Aquelas horas nunca iam passar, ela poderia deixar no bar um bilhete com seu nome e telefone de casa, quem sabe, se morresse pelo menos alguém saberia quem era ela, ligariam pra seus pais. “Pelo menos morreu em paz, fica com deus minha filha”, seriam as palavras do túmulo dela. E morreria só, sozinha. Sem ter dormido o sono que tanto queria, sem ter descansado a sua mente inquieta.

08/11/2007

Meus cabelos crescem
E minhas idéias crescem com eles.
Minhas sobrancelhas crescem
E com elas minhas unhas crescem

Sem parar

Tomam conta do quarto, enrolando-se
A raiz castanha e as unhas vermelhas
Se perdem


No fundo azul


Dos meus lábios quase derramo as palavras
E no tapete se forma uma poça de água
De meus olhos abertos
De minha boca aberta

Água morna

Vem quente lá de dentro do meu peito
Que incha junto com meu desejo
Cresce corpo a dentro e lá fora
Abre-se o céu.

Tamanho de céu

Minhas mãos incham
E já não seguram mais a cabeça
Que ficou pequena demais
Pro tamanho das idéias

Muitas idéias

Saem pelas orelhas vermelhas
Da cor das unhas longas enroladas
Como lava fervente escorrem

E queimam, queimam tudo
De meu corpo sedento.

29/10/2007

Uma resposta

Lá vem.

E o que vem?

Vem que vem, assim:

No encontro de duas almas.

Uma de lá, uma dela.

Ou outra minha, assim:

Nos encontros do mundo.

Corto daqui, e vejo que lá

Também há de tudo isso.

Dos pontos, das vírgulas

Das “gentes”.

Então sim.

Quem bom que sempre tem.

Que sempre vem esse

Tal de alguém

Pra poder por um ponto

No meu outro, daqui.

19/10/2007

Die Gedanken Sind Frei

Os pensamentos são como a água. Podem estar tão parados que vemos refletido neles nosso próprio rosto, passivo; ou estarem tão atormentados que mal se enxerga o fundo. Os pensamentos são como a água, claros, límpidos, ou escuros e amargos. Ou profundos, ou rasos.

Quem pode beber dessas águas sem se afogar? Ou nadar pelas idéias em tormentas, livres ondas gigantes de idéias, tombando, tombando. Quem pode me dizer a onde terminam?

13/10/2007

Era sonho?
Tudo que é sonho é sonho.
E depois disso, só penso:
Não quero acordar para morrer.

E se por acaso não o fosse?
E nem a vida eterna?
E nem amor eu tivera?
Viver amarga e acordada...

Mas pasmem!
Quando os olhos eu fecho
Crio tudo da escuridão.

Viver de sonhos
Viver pra viver
Tudo dentro de mim, ilusão.

10/09/2007

Ventos

Veio de dentro aquele furacão sem dono
Acertou no peito e depois, abrindo para o espaço
Tomou pelos braços e levou com desespero.
Tamanha a força dos ventos projetados
Seria impossível deter tal destruição.
E levou tudo o que havia por perto:
Amor, respeito, alma e coração.

Sobrou uma brisa de desgosto que veio
Varrendo a poeira fina aos poucos
Que sobrou em cima da mobília, no chão
E em todas as coisas do mundo.
Um silêncio profundo se apossou então
De dentro pra fora e de fora pro céu.
Nem o sol podia escondê-lo em suas sombras.

Nem as sombras eram suficiente breu
Perto das escuras esquinas avassaladas.
Dali nem flores mais brotaram, nem nada.
E sobrou somente o chão de terra
E hoje as janelas fechadas choram.

30/08/2007

Diálogo

(Um trago)

Você sabe, já leu aquele texto do Cortazar...Sobre os coelhos? Sobre aquele cara que vomita coelhos e sem nenhuma razão ele passa a amá-los? Ele passa a amá-los porque é aquilo mesmo, uma coisa de dentro pra fora, só sua, pessoal.

Mas ele se mata no fim, quer dizer, eu acho que ele se mata. Foi o que eu entendi.

( Um trago)

É engraçado tudo isso. Uma amiga minha falou que após ela cair da cama, ela teve uma revelação. E essa revelação só poderia acontecer nestas circunstâncias, você ta me entendendo? Não existe revelação que fuja a esta regra, e ela ainda completou: “Aquilo foi místico, tanto quanto o meu desconhecido fim do dia”.

Tanto quanto o meu desconhecido fim do dia. O real deixa de ser real quando a gente vive o passado ou o futuro, que não existem. Você não acha isso estranho? Saber que, depois de agora é tudo ainda uma grande mentira.?

(A fumaça do cigarro envolve o quarto, o olhar pára fixo no teto)

Eu, particularmente, não acredito que exista um futuro. Essa forma desconexa e esquizofrênica que nos faz comprometer-nos com coisas que também desconhecemos. É tão frágil essa linha que une o agora e o que será que, o melhor seria permanecer, nesta posição, eternamente.

Mas daí eu me lembro que ainda não comprei as flores nesta semana. A semana é futuro, virtual, portanto não existe, mas eu tenho que fazê-la existir, senão jamais teria comprado flores na semana passada, e aí não poderia as comprar essa semana.

Mas as flores, assim como o meu fim do dia, morrem, suavemente, semana após semana.

(trago longo)

Eu deveria comprar cristais ao invés de flores. Cristais são bonitos e super baratos. Cristais me lembram chapada diamantina, e essas coisas da natureza que me acalmam. Verde, verde, verde. Azul, flores, formigas.

Eu sei que isso ta parecendo pedantismo, mas diante das circunstâncias, só me resta pensar no horizonte além da minha janela anti-ruídos.

(piscada, tragada, o olhar fixo na janela)

Existem pessoas que não gostam da natureza? Sim? Não? Eu acho que sim, acho que existem pessoas que abominam este contato direto com a fauna e a flora. Só de pensar em tirar o sapato, caminhar a esmo na beira de uma praia as deixam aflitas .

Mas tudo bem. Tudo bem mesmo. Ninguém tem que gostar da natureza, porque nós somos a natureza. De algum modo, caminhar sobre a grama e admirar os pássaros não passam de afirmações redundantes. A gente não se nega, da mesma forma que é impossível eu falar: eu não existo.

E daí? Você ainda ta me ouvindo? Eu to te irritando?

(levanta da cama, abre a janela)

Acho que eu deveria escrever tudo isso que to te falando em algum lugar, seria legal não esquecer todas essas coisas bonitas e sensíveis que estou pensando. Seilá, começar a escrever um livro existencialista que detonaria Sartre e Nietzsche. Mandar pra algum concurso da faculdade de letras, ficar famosa enfim.

Gozar de todo o prazer da vida pública, ser chamada para coquetéis e jantares. Usar um nome artístico como La Femme Trousseau, por exemplo.

Uma coisa bem difícil, assim ninguém vai ter coragem de me perguntar porque cargas d’água eu resolvi ser escritora.

21/06/2007

Para Rafael

Menino
Da onde vêm seus sonhos?
sonha com tudo que pode sonhar.
E se não te bastam as estrelas, o céu
Vai além além.
Na rabiola do cometa, na corrente de ar.
Sempre olhando pra cima
Pro teto da vida, sem esperar
Que talvez um dia cresça.
Seus pés inquietos
Correm de um lugar a outro,
Nunca param ou descansam,
Nem dormem.
Da onde vêm seus sonhos?
Pra onde vão suas palavras?
Sempre atentas e prontas para saltar
Da sua boca aberta aberta.
E seus olhos, menino
Focando tudo que há de perto
De longe, de belo e de feio.
A sua inocência se confunde
Com o seu nome.
Rafael, nome de arcanjo
Mensageiro e curador.
Assim é você:
De asas abertas, indo sempre para o alto.
Mais alto mais alto.
Como um balão
Feito de ar e sonhos.
resolução quatro: alma lama.

Há uma lama dentro de mim.
Na alma, ela chama em chamas.
E na cama, a lama em minh'alma
canta em voz alta os sonhos ao dormir.

13/06/2007

Paixão!

Estou Sofrendo.
O que tenho?
Paixonite Aguda.
Os sintomas, muitos.
As horas sofridas não cabem no relógio.
Só penso no amado em cada tic-tac de hora.

Todas as cartas são para ele!
Até a inspiração esse amor devora.
Os poemas? Só de amor escrevo.
E claro que dentro do peito
o coração palpita desajeitado!
E até da água que bebo
dedico a ele todos os goles dados!

É paixonite do que padeço!
Da onde veio tal virose?
Me pegou de jeito um dia.
E até hoje sinto ela aqui dentro.
Sorrio toda hora, sintomática reação.
Não presto atenção nas palavras
que os outros me falam.
Nem presto atenção no jardim
pois há dentro de mim uma outra rosa!

Ah como estou sofrendo!
E sofro mais ainda quando ele
não está por perto.
Daí sim, calafrios e tremedeiras.
Suspiro no canto sem razão nem por que.
Meus olhos ficam profundos e lânguidos.
E tudo o que desejo é poder estar:
Ao seu lado, dentro dele, respirando
o ar que ele respira, sentindo o amor que
dele expira.

Ah! Não sei se agüento!
Não sei se posso mais este tormento!
Doutor deveria tu curar esse sentimento,
curar de mim essa paixonite aguda.
Pois não como nem penso.
E o que resta de mim é só poesia e açúcar!

05/06/2007

O que é Causal?

Amor Causal: Adj. 2 gén., relativo a causa;
que exprime causa;
s. m.,
razão;
origem;
motivo, proveniência.

Andava tão tristinho e cabisbaixo,
Sem aquele amor, a razão não existia
Sabia de cor, todas as suas cores preferidas.
E ainda assim, o destino foi vigário.

Como foi árdua a conquista!
Com flores, jantares e promessas.
Aquele amor, sofrido deveras,
Merecia ao menos uma jazida!

Foi só por ele que feliz a vida corria
Brilhava o sol de cada manhã azulada
Estampado na pele da querida amada
Tudo era tão feliz, e o amor uma piada.

Mas agora, sozinho na caminhada
O amor sem rumo vagava obsoleto
Onde foi que ele perdeu o bom senso?
Por onde andas a razão almejada?

Já não podia mais com esse medo
De ficar só, sem razão e sem amor
Como alma penada em busca do senhor
Ficou ele no mundo sem o seu desejo.

E agora o pobre vaga a esmo
Olhar perdido no horizonte cinza
Lucidez, aquilo já não mais tinha
Deixou-a morrer, esquecida no tempo.

O que é Casual?

Amor Casual: Do Lat. casuale
adj. 2 gén.,
que depende do acaso;
fortuito;
eventual;
acidental.

Foi assim, cruzamos os caminhos sem nos ver
E só quando você chegou à outra esquina:
Que coisa de filme de teve!
Olhou para trás e disse: Que linda!

Nossa, Obrigada! Pensei ainda
Que fosse para mim tal elogio.
Mas você grudou a cara na vitrina
Ouvindo no rádio uma música dos beatles.

Daí eu disse: Essa eu nunca tinha ouvido.
Eu cheguei mais perto e vi seus olhos
E seu rosto alvo estava todo sorrindo:
Poxa, essa é a música que eu mais gosto!

Quer ir lá dentro ouvir os outros novos?
E me puxou pela mão sem perguntar.
Dentro da loja por entre vinil e mofo
A vontade que eu tinha era só de dançar.

A gente se olhava sem se falar
O que tocava era tim maia: Bem querer.
O que a gente sentia, não tinha mais lugar.
O amor ali nascia, e a gente sem perceber.

31/05/2007

Amor: Filosofia ou Suicídio?

- Amor é casual.

diria uns.

- Não, Amor é causal.

Senzala

Todos os dias acorda no pescoço.
Às seis da manhã:
Lavar o rosto, acalmar no corpo
o calor da febre terçã.

O corpo rijo como um cavalo,
marcas de aço no seu rosto roto.
Negro amargo, sem dentes
na boca de comer arroz e osso.

De morrer cada dia um pouco.
De encher seu bucho morto.
De morrer negro no lodo

Igual a cor da sua pele,
remexe dentro do poço,
No estreito poço o seu corpo cavalar.

Definição

O amor tem cor de azul celeste,
claro e leve, voando solto
como oxigênio no meu corpo.

O amor é quente e bobo,
como um bebê ao nascer.
E azul celeste, leve.

Leve e bobo
De um azul celeste.
E breve.

Breve,
tão breve,

que me vem

como

uma

e
s
t
a
ç
ã
o
...

Domingo

Meu corpo cansado
estampando o vermelho rosado
dos último raios de sol.
Como uma fotografia na fina película
fixa-se em minha carne,
em meus ossos, e minhas unhas
tornado-se mais pesada
mais cansada e mais completa.
Cansada e feliz com o tom de
romãs rachando as cascas
maduras no pé.
Sinto-me como uma fruta madura,
escura e robusta.
Descansada por ter o sol se ido,
e jogado por cima frescas brisas
marinhas ao fim do dia.
Me sinto do mundo o umbigo,
nesse último soprar de domingo
deixando-me levar todos os pensamentos
fulgazes]

Cuidado

Às vezes eu penso:

Meu amor não agüentaria ser jogado assim no lixo.
Portanto que sejam verdadeiras todas as juras.
E se for para ser breve, que seja intenso.
Ia doer, talvez doesse só um tiquinho.
Talvez nem dor eu sentisse.

Mas ia ver a feiúra
De um dia sem pintura.

Então,
Não se iluda.
Mesmo que seja mentira,
Aquilo que na sua boca se insinua.
Me faça acreditar que naquele momento,
Tudo o que for para ser, vai ser por inteiro.

29/05/2007

De Camille - porque eu acho ela muito sensível

"Quand Je Marche"

[When I walk, I'm walking straight and when the night falls, I fall as well.]

Quand je marche, je marche
quand je dors, je dors
quand je chante, je chante
je m'abandonne

Quand je marche, je marche droit
quand je chante, je chante nue
et quand j'aime, je n'aime que toi
quand j'y pense, je ne dors plus

Je suis ici
je suis dedans
je suis debout
je ne me moquerai plus de tout

"Entends tu, m'as-tu dit,
le chant du monde", alors depuis
quand l'aube se lève, je la suis
et quand la nuit tombe
je tombe aussi

Je suis ici
je suis dedans
je suis debout
je ne me moquerai plus de tout

Quand j'ai faim, tout me nourrit
le cri des chiens, et puis la pluie
quand tu pars, je reste ici
je m'abandonne
et je t'oublie.

28/05/2007

O amor é para ser passado e repassado
E quem quiser julgar- que o sofra
Ninguém aprende com a cabeça, mas com a carne
E a carne não é fraca, ela é estúpida
Sair do poço é sempre um ato de heroísmo
E ser herói, não é ser forte
É ter coragem de ser fraco.
É por, repor, transpor, sem dispor.
Se as experiências fossem transmissíveis
Este seria um mundo de sábios
Mas só nascemos de nosso próprio parto
E só vivemos de fato quando já
Morremos mil vezes e mais uma.

Ivan

Olha, eu fiz uma poesia pra você:
Ivan, que rima com Imã
Que me pega bem nos botões.
Ivan, que rima com romã
Que rima com eu e você
Mesmo que isso não rime.
Eu coloquei no poema.
Porque eu te prometi um poema.
E aqui ele está:
Ivan que rima com céu
Que rima com um melzinho doce
Do seu hálito.
Ivan, rima comigo.
E eu assim fico.
Doida pra te escrever.

Vou escrever mais poesia

Vou ser mais poeta e mais rima

A Inspiração não morreu ainda

Dentro de mim lateja

Como o papel molhado em tinta.

Sebastian

Quando se fez a primeira luz da manhã,
Sebastian saiu correndo pelo gramado.
Pegou a bola, jogou no gato, uma pedrinha,
Uma folha e um galho
E lá estava ele pirateando.
Pequeno como era, sem sapatos e sem camisa
Peito estreito e branco
Sebastian era quase um menino
Mas era mais menino que os outros do bairro!
Gostava de dizer, assim mesmo ao acordar:

Mamãe quero leite da vaca
E la ia ela correndo buscar para o pequeno
Um copo cheio e morno direto das tetas.
E Sebastian sorvia aquele mel
E sorria e cantarolava
Na alegria da infância serena
Ser Sebastian para ele já bastava.

23/05/2007

cigarro

É no cigarro que eu trago onde está o veneno
São nos objetos do quarto onde está o frio
E mesmo assim dentro de mim não há nada
Não há nada em lugar algum.
E se então eu tirasse a pintura do rosto
E deixasse uma vez só mostrar a pele
Deixar ela respirar o pó do mundo
Pois não há nada em lugar algum.
Isso não é dor sem sentido
Talvez melhor assim preenchido
Só as portas aqui fazem barulho
Uma atrás da outra elas se fecham.
Não há mais nada em lugar algum.
O fim desta tarde é de cinza escuro
Nem a luz consegue chegar aqui
Neste silêncio profundo
Onde só as portas fazem barulho.
Onde só os carros fazem barulho.
Onde só a chuva faz barulho.
Neste fim cinza escuro.
Pois não há mais nada.

21/05/2007

É o Fim

É o fim de tudo
E lamentavelmente a vida
Nos mostrou a verdade
Que é dolorida
Que é pessimista.
E como te dizer que
Depois de tudo o que passou
Ainda te amo
Mas não posso!
Não posso mais sofrer assim
É o Fim.
Por quais caminhos
Nos enveredaremos agora?
Mudastes tanto a tua rota
E me isolastes por tanto tempo
No porão do esquecimento
É o fim.
Custa-me a enxergar
A luz novamente
Enxergar por que fomos
Tão errantes
Em nos embalarmos com essa
Mágica música do Amor
Que parou
Que passou
Que voou
Para longe de nosso controle
Triste fim para um amor assim.

16/05/2007

O poeta abandonado

Só mais uma vez
e depois pode partir
não precisa se despedir
ou beijar a minha tez.

Sonhar um querer
e ter de ti pesadelos
só mais uma vez
tentei com tanto zelo

Agora deixe que eu morra
sozinha sem teu olhar
secando minhas pupilas

Só mais uma vez poderei
agora que enfim se vai
morrer morrer morrer.

Poesia Moderna

Tu
Tu e eu
Nós
Apenas nós
em baixos tons
Minha voz
Procura teus ouvidos

Sonolência

Dormindo se quedam os inocentes
sem peso, sem medo
Como tolos perdem a alvorada
como tolos ficam no travesseiro a sonhar
com um sol que já nasceu
Esperando a noite chegar para enfim
acordarem nas estrelas do céu.
Sempre nas estrelas
Sempre na Lua
pequenos seres do espaço sonífero

dormindo
dormindo
dormindo

15/05/2007

Resolução três: menos sal e mais amor.

Joana.

Olhou para fora e ainda chovia muito. Enfiou a cabeça sob o travesseiro e tentou dormir mais um pouco, não conseguiu, óbvio. Dois Tylenóis de 750 mg, café preto dois dedinhos no copo, uma garrafinha de água para tentar aliviar a ardência da cafeína. Realmente seria impossível pregar os olhos de novo, e ainda eram apenas 7 e 30 da manhã.
Pegou o telefone, discou, esperou, desligou; daí ligou de novo:
"Alô, André? Eu te acordei? É, eu sei que tá cedo, mas é que eu tomei uma decisão...Qual? Ahm..."
Ligou pra falar mas não falou, inventou uma historinha qualquer.
"Você vem almoçar aqui hoje?Vou fazer aquele macarrão, aquele que você gosta tanto."
Já havia uma semana que não dormia, um misto de medo infantil e ansiedade. Escreveu no seu diário que o ser humano quanto mais pensa menos evolui e realizou que a evolução depende muito mais de um estado de deixar-se estar do que realmente tentar resolver os problemas em questão.
Uma partícula de onda gigante, era só ela e no entando precisava de toda uma massa de energia para poder mover-se. A humanidade, refletiu. Não seria fácil levantar-se da cama hoje, tinha medo de começar o dia e não poder terminá-lo como queria, ia dar tudo errado.Tinha mais que certeza, mas não podia deixar que tudo isso a tomasse por inteiro. Tirou o pijama na cama mesmo, saiu nua para o chuveiro, banho frio, esqueceu de escovar os dentes e saiu direto pra rua.

O Amor em Três Atos.

Um dia ela me pediu para escrever um poema sobre ela:

“Amor, porque você nunca escreveu um poema sobre mim?”
“Eu não sou bom com as palavras..não sei rimar amor e dor”

Eu sempre a achei meio burra, mas às vezes, me emociona a burrice dela. Me emociona como ela me olha vazio, buscando compreender as sutilezas que a vida tem. Parece um cachorrinho, uma gatinha. Um pássaro até...Os pássaros tem o olhar animal mais burro que já vi.

“Mas você é fotografo, então é artista, e todo artista sabe escrever poesia.”
“Não querida, isso não quer dizer nada. Me passa o café, por favor?”
“Não. Eu quero que você escreva algo sobre mim. Para a posteridade”
“Você ainda não morreu Ana, então eu não preciso escrever nada sobre você.”

***

Quando eu menos percebi, ela já estava acordando ao meu lado. A primeira vez foi chocante, quase idílico. Ana...É vago na minha memória o dia exato em que nos conhecemos. Pode ter sido num café, perto do meu trabalho. Ou na vernissage de algum pintor de quinta em alguma galeria de quinta. A verdade é que não tenho boa memória. Poderia ter sido qualquer outra mulher acordando ao me lado. Qualquer uma. Se elas não abrem a boca, eu praticamente apago os vestígios delas em minha vida. Mas eu me lembro a primeira coisa que Ana falou quando acordou:

“Nossa, aquilo é um pássaro? Que coisa estranha...”
“Não, parece um pássaro, mas na verdade é um tennis numa árvore... Uma fase minha meio... abstrata.”
“Ah... abstrata é? Eu também tive uma fase abstrata, eu te falei que adoro pintar?”

Foi aí que eu olhei melhor para ela, o cabelo desarrumado, pintado de um vermelho vulgar, não conseguia associá-la a nada, nem a ninguém. Uma estranha que gostava de pintar.

“Eu pintava umas manchas, mas isso era na época em que eu não sabia pintar, agora que eu fiz o curso, quero pintar retratos das pessoas, especialmente das minhas amigas”

Enquanto ela falava, eu acendi um cigarro.

“Você fuma?”
“Não fumo não, cigarro estraga a pele.”
“Então vamos trepar.”

A trepa foi ótima. Adoro o cheiro amanhecido da mulher. Perfume doce com suor, com hálito. E foi por isso que me apaixonei pela Ana, ela era barata, mas muito gostosa.


***

O que eu entendo como amor é simples. E por isso amo a Ana. Simplicidade é o nome do jogo, do jogo dela. Faça as perguntas certas, responda vagamente, trepe três vezes por semana. E quando acaba, tem que acabar de vez. Como um dia que amanhece. Esse lance de guarda a calcinha, fotos, frasco de perfume, é coisa de apaixonado não correspondido.

“ Tira uma foto minha, amor. Você tira foto daquelas modelos todas, mas não tira as minhas...”
“ Não posso fazer isso com você Ana.”
“Por quê?”
“Porque no dia que você me deixar, ou no dia em que tudo acabar. Eu vou olhar praquelas fotos e vou ter que te odiar.E eu não quero te odiar, só vou querer te esquecer.”
“Você é tão romântico, bruto, mas romântico.”

Essa foi a última vez em que trepamos. Mulher burra cansa também. Eu olhava pra ela, dentro de seus olhos de vidro azul e não conseguia enxergar sua alma. Talvez a Ana não tivesse alma. Ou tivesse alma de gato. Perdi o tesão nela quando ela pediu pra eu não a esquecer. Mas já esqueci. Até do seu cheiro eu esqueci. Só restou mesmo um pedacinho de guardanapo com uma poesia que ela escreveu.

“ Se você quer saber o quanto eu te amo, multiplique as estrelas do céu, pelas gotas do oceano.”

A Ana era muito burra, mas era sensível.

03/05/2007

Penso Logo Desisto

Para alguns verbos
Eu sou apenas um ser
Sem estar, nem presente
Apenas na mente
Ou num passado distante
Quase inexistente
Sou, não porque existo
Me defino apenas como um som.

Sadomasoquismo

A dor existe para que o amor seja verdadeiro
A dor existe para que a verdade ame
e dê sentido ao que logo se extingue
depois de cada beijo
cada ferida marcada no beiço
cada estalar de cada dedo nos seios.

Só prevalece o silêncio
para que se sinta desmiuçadamente
os suspiros prazerosos
as lágrimas cândidas
do amor sofrido.

Nem a solidão dói mais
Nem o abandono entristece
Pois o que não mata, fortalece
esse coração que só ama.
Ama e ama e nunca desvanece

aborto II

Sujei minhas mãos de sangue novo
e já não mais sei como pensar nisso
abortei de mim um ser sem rosto
sem nome

Não saberia o que fazer
por desespero, desisti
calei-me e chorei a cólica do ventre

"Nunca pensei que..."
"Não, não seria possível..."
"logo eu, um ser tão pacífico..."

Deixei-me levar pela tormenta
será que sou uma assassina?
Será que simplesmente aparei
as pontas tortas do caminho?
Tão confuso
Tão só, tão sombrio...
Hoje apodreço por dentro
uma flor em decomposição
não existe mais sentimento
onde antes era só desilusão

Meu corpo, esse imenso balão
flutúa solto no ar rarefeito
por dentro ozônio e carvão
por fora só sorrisos de efeito

E adormeço desse jeito
amuada em meus braços
sozinha no frio do leito
sonhando com enormes vasos
sonho com águas de fundo
sonho com águas de fundo raso
que poderiam alimentar a flor
pois dentro de mim eu cavo
a vala onde deita a dor.

Back to mine

Back to me

Back to my home sweet home

That’s all I want indeed

But for now I just know

I just can know one little thing

That I’m on my own, no more with you

Once I’ve been enjoying truly

Sadness is human, loneliness it is too

But suffering no one can feel

Is such a big pain that’s unbearable still.

But for now nothing really has changed

I still feel the obstacle that I put on my way

Don’t cry there, I wont cry here

We have to forget ( and forgive) together

Those moments of happiness

A andré

O confete da minha saudade
André, mal lembro dos teus olhos
-quiças sóbrios?
De você só tenho números em outras agendas
Poderia se ter mantido mudo
mas não o fez.
Te dou dez cavalos, André
E você fica comigo.
Vou à praia, ao ibirapuera
a um show qualquer, André.
Por quê não me ligou mais?
Agora somos (os dois) incapazes.
Ouviríamo jazz
E eu deixarei você continar sendo o que é.

aborto

Agora embalo no ventre a dor e a cólica
Temo toda vez que vejo o sangue ralo vermelho
Que desce ainda pela memória, nas mãos, nos meus peitos inchados
O meu corpo é agora um cine-ilusão
Depois, antes e durante
Os hormônios me dizem ; sim, sim e não.
Será que estou ou não?
Não é para rimar esta triste poesia
É só para aliviar a ausência da presença
Que engulo todo dia como uma hóstia sem poder falar
Fui eu.
Neste corpo frágil
Arranquei toda a era daninha
Revolvi a terra fértil e deixei que tudo acontecesse
E o pior é que não estou sozinha
Mas o corpo ainda é meu
E só em mim tudo, tudo, absolutamente tudo.

Ensaio sobre as Mãos - baseado em Vinicius

"De repente do riso fez-se o pranto
silencioso e branco como a bruma
e das bocas unidas fez-se a espuma
e das mãos espalmadas fez-se o espanto"
e das mãos espalmadas fez-se o encanto
tornou-se os olhos d'alma
um breve susto ao tocar o mundo
com as pontas dos dedos
ao sentir que tudo a sua volta estava
e estará em alto relevo
um braile romântico
e pensar que mesmo surdo ou mudo
consigo todas as músicas cantar
fazer das mãos côncavas conchas do mar
onde ressoam as letras
as palavras e o som
tenhos os olhos em minhas mãos
tenhos os ouvidos em minhas mãos
tenho em fim,
o começo e o fim de meu corpo
e então, por mais que eu busque
um lugar neste planeta sensação
tenho, acima de tudo
o mundo em minhas mãos.

Pé de Caqui

O que me impressionou hoje
Foi um pé de caqui
Com os cachos cheios de frutos
Frutos verde-amarelos que não comi

Não comi porque estão adstrin
Adstring, gentes
Nunca havia visto um pé
Desse caqui amarelo verde

Todos juntos num enorme galho
Há mais de um por ali
Ali, onde nascem os caquis
Impressionantes cachos cheios

Me saliva a boca
E hoje a noite vou sonhar com eles
Sonhar que estou em seus galhos
Comendo sua carne e matando a minha sede.
Pesado
Pesado
Pesado e profundo
Aço único
Cortante
Passa fundo
Úmido e certeiro
No escuro
Pesado
Pesado
Pesado e profundo
No escuro
Uiva o urso
No escuro
Durmo o sono
O sono pesado
Pesadelo
E só.
É outra vez chegada a hora
que tanto esperávamos
A natureza viva [as pedras eternas]
A tarde morta [cansaço]
o calor [mormaço]
o humor [sarcástico]
o rumor [baixo]
o som [um tom]
o Omn [trancender]
tudo zem

Sem medo
de
morrer.

Piadinha

Rir,
mas que nada!
Marmelada se te disseram
Que felicidade estás na CARAS.

Guerrilha

O meu coração é a prova de balas
E meus braços são de aço
Minh'alma de marfim
E não importa o faças, nada vai perfurá-la

Meus olhos são de jade
mas meus lábios de cetim
Então não tente fazer nada
pois nós dois sabemos do poder das palavras

E o quanto elas pode ser como navalhas
Eu sei que suas armas são fracas
Todas elas sem muniçã0

Fique atento, meu bem
Eu sei de todas as suas estratégias
Para sangrar meu pobre coração

Antagonismo

Digas aos dinânicos
que não me levantarei hoje!
Aos padres
que vão para o inferno!
Às damas e senhoras (com todo o respeito)
pervertidas reprimidas!
Aos assassinos
que continuo viva!
Para as crianças
diga apenas que isto é uma dança.
Aos rafaéis, daniéis, bernados e a todos
aqueles do sexo oposto,
que menti de coração!
E a todos os inimigos (se me permitem)
que estou do vosso lado.
Diga ao mundo que hoje é um domingo e feriado,
e que estou aberta a todo tipo de comércio,
e a todas as controvérsias!

vibração

Venha agora
sente-se do meu lado
sinta
a vibração que inspira
toda vez que me toca.

Blue blue blue

Olha quanta lorota tá rolando no seu rádio,
você chora a toda hora quando vê o noticiário,
E te perguntaram se está tudo bem.
Você pensa duas vezes, se engole, se devora,
mas responde triste: Este mundo não tá nada blue.
Mas mesmo assim,
você vai ao supermercado e compra qualquer coisa
rotulada, válida, fora de hora.
E te falam bem baixinho quando vai chegando ao caixa
que esse mundo não tá nada blue.
Cadê o seu sorriso quando mais precisa dele?
Daí você se lembra dos dentes que não tem,
e dá um sorriso banguelo na frente do espelho.
Se lembra do encanamento, do chuveiro, do seu sexo
e do mal cheiro que sai do ralo.
Mas que caralho!
Esse mundo não está nada bem!

Nostalgia do Abandonado

Mergulho em meus pensamentos
me afogando nas tuas pesadas palavras
e sua falta bate em meu peito
fazendo rolar duas grossas lágrimas
O vazio toma conta de mim aos poucos
e me calo.
É como se eu estivesse só neste mundo
e a única coisa que restasse fosse a lembrança
tão nítida, tão real do seu sorriso.
Grito! Mas ninguém me ouve.
Meu desespero é tão grande amor,
e a dor me espreita pela janela.
tenho tanto medo!
O meu receio, é como o frio
que penetra pelas minhas costas e
me toma pelos braços.
Você está tão longe, amor.
Mas sinto o teu calor nos meus lábios,
Ah, não sei como expressar a sua ausência.
Áspera ausência.
Me perdoa, diga que me perdoa.
Pois não durmo sem antes chorar
lamentar o meu erro.
Tú és tão único quanto um coração
a um pobre homem.
Me perdoa.
E serei o único ser que sorrirá
quando o breu da noite cair
sobre o mórbido dia.

Poesia Concreta

Um monte de cimento e pedra.

02/05/2007

O poeta que ficou triste

Me cansei de falar de amor
de rimar amor com cor
e de chorar.
E escrever enquanto de esperava
sobre coisas da vida
sobre a sacada
sobre nossas brigas.
Me cansei também de falar de poemas,
de jogos de palavras isentas,
de sentimentos inventados.
Me cansei de ficar aqui,
parada, pensando.
Pensando no que escrever
nos poemas que falam de prazer,
e de sexo de sabor de objetos.
Não quero mais criar e recriar palavras
duras palavras que me esforço em relatar
nas linhas do papel.
É tudo tão sutil, percebe?
Cansei de observar as cores do outono
E dos outros que passam por mim.
Ando tão deligada,
que se pudesse não faria mais nada além de dormir.
Não quero mais pensar no que falar,
antes de agir com atos cada vez mais banais.
A vida parece um filme colorido,
que percorre no seu próprio ritmo.
Terminando por aqui eu digo:
Não quero mais soletrar sobre o céu
azul da cor do mar.
Quero me afogar!
Sim, isso me faz sentir viva,
Enquanto eu digo aos outros: não desista!
Desmaio sem ar no meio de meus pensamentos
fulgazes.

Soneto da Saudade

Das lembranças apenas sombras,
horas e horas apenas
Da boca apenas o sorriso,
apenas os olhos, fixos apenas.

Apenas o azul do céu
apenas um simples céu,
azul apenas
Deixado pelas ruas amenas.

Você deixou aqui
uma parte de ti apenas
que féri sem sentir pena.

Apenas algumas cenas
estreitas e pequenas,
apenas saudade.

LAUGH

Diga "rárá"
Vamos, pode rir.
Ria da minha cara
Ria do meu corpo
"rárárá"
Do meu péssimo papel de protagonista
Do meu mau gosto
Das minhas gírias
"desires"
Mas diga,
mesmo assim diga:
Que fui linda quando queria
Que ao menos me desejou.
Ria.
Ria enquanto tenha dentes.

Sentindo ( sentido)

Venha,
faça uma síntese de mim
me sinto tão só.
Olhe,
escreva um resumo de
minhas lágrimas
estou tão amarga.
Percebe?
Mostre-me,
dê-me uma chance
de me deitar no seu colo.

Verbos

Palavras machucam mais que espadas
Fatos matam mais que falsos abraços

Estou sangrando sozinha conjugando
todos os atos
Todos os verbos que te tua boca
saltaram

me afogaram

Soneta da Sala De Jantar

A mesa vazia
as cadeiras frias, contidas
de uma madeira preta
rachada, calada, sozinha

O chão de verniz
na sala de jantar
reflete faces vis
de momentos banais

A toalha rendada
escondendo as fendas
velhas e feias da mesa

A sala sombria
assombrada por reles fantasmas
sentados sobre o pó.

Ira

Me cansei das baboseiras
tô cansada da tua cara
to cansada da tv
to cansada desta casa
Por mim mudaria tudo
colocaria um muro
entre eu e você
Atearia fogo no armário
faria um escândalo
Seria deportada
Assassinada
Por isso me cansei desta porta
vou joga-la fora
e fugir para longre daqui.

Soneto do Poeta Apaixonado

Foi você quem roubou
este pobre coração
o colorido das plantas
o ritmo da canção

O brilho do sol
O frio da estação
então foi-se embora
sem dizer a direção

Restou-me apenas a solidão
um soneto e um refrão
apenas estes poucos versos

Porque você roubou até os verbos
e agora não faz mais sentido
caminhar sozinho pela escuridão.

Imagem

O gosto das lágrimas que são tão ásperas
eu sinto na boca descontente
com o peso ardente de meu corpo desforme
com contornos sobressalhentes.
Na frente do espelho observo dedo por dedo
cada detalhe me é revelado
cada esquina minha nua, triste, assustada.
Vejo a minha silhueta na meia luz do quarto
e vejo cada erro considerável
que ficou pregado na minha memória.
Em todas as partes, nos joelhos, nos calcânhares,
uma insatisfação imensa me dá um arrepio.
Sinto minhas mãos pequenas
tão pequenas...
Passo-as nos cabelos, nos meus poucos cabelos
que escondem meus pensamentos de sabor azedo.

Miopia

Procurava por um ponto de vista,
um ponto-isca para equilibrar-se
e não via, mesmo forçando
sua mais nítida perspectiva
Uma imagem sequer perfeita, ou vesga.
Imagens duplas, ilusões multiplas
Apertada os olhos, os pulmões, a boca
apertava os dedos, os medos, os tendões.
Mas nada se formava na sua retina.
Estava tão perdido, sozinho
enroscado no anti-realismo
projetado pelos seus neurons
neutrons e elétrons.
Seria ódio? Seria Amor?

Soneto

Só um soneto de dois quartetos
Dois verbos e dois tercetos
E talvez alguns termos sinceros
E uma pitada de dor no peito

Só um soneto resumiria tudo!
Faria de uma novela, um ato
Dentro do pequeno palco escuro
- Mas que sonho açucarado

Pareço até um velho burro
Sonhando com este soneto
Que não existe neste mundo

Apenas dentro de meu tormento
Queria eu escrever um soneto
Que terminasse sorrindo e vermehlo.
Cai no abismo de mim
Assim, tão sofrido
Tão sem fim.

Queda livre
Em Vão
No abismo de meu


Coração
Resolução dois : Só a Poesia pode me salvar.

Não Somente

Não te deixarei roendo
unhas no escuro quarto
engolindo soluços como sapos
esperando alguém te chamar.

Não deixarei te machucarem
te estuprarem, te arrancarem
o coro do corpo com a dor!
te marcarem o rosto com picadas letais

Não!
Não te abandonarei às feras
no meio da arena repleta
de risos banais

E te ver morrer lentamente
cada parte de teu corpo
dócilmente
se ar.
resolução um : Mais água e menos armas.

24/04/2007

Terapia

Ela se deitou no sofá, esticou as pernas até alcançar uma almofada e ficou se olhando deitada no espelho da parede. Uma parte do vestido dela escorregou de seu colo e tocou o chão. Com uma das mãos segurou a ponta dele e ficou brincando, contornando os desenhos da cerâmica do assoalho. Os dedos dos pés estavam inquietos, torcia e retorcia, estralava, esticava.
Preciso de terapia.
O outro braço tampou seu rosto. Só se via o perfil do seu nariz fino, de seus lábios finos de seu queixo fino. Ela toda parecia um risco de grafite numa tela branca.
Preciso de... De alguma coisa. Talvez de uma bicicleta. Mas acho que a terapia seria o mais apropriado.
A água do vasinho de flores estava escura e com partículas de sujeira, a planta ainda tentava viver, umas margaridas.
Você tá me escutando?
Uhum.
Você realmente escuta alguma coisa do que eu falo?
Terapia, você falou que precisava de terapia.
Não, eu falei que você me entedia, e que por isso eu preciso de terapia.
O seu rosto se virou pra mim, os olhos fechados, os dedos dos pés voltaram a se contorcer mais rápido.
Então você mentiu, você é uma mentirosa.
Seus olhos se abriram e me fitaram pra logo em seguida fecharem de novo, o braço voltou a cobrir seu rosto.
Jamais acredite nas palavras de um poeta.
Você nunca me falou que era uma poeta. Nunca vi nada seu escrito em lugar algum.
Eu não menti, mas eu precisava nos salvar. Me salvar, talvez. Precisava dizer pra mim mesma que você valia a pena.
E então, qual a conclusão que você chegou?
Que você é um chato.
Depois de três anos?
É.
Você não precisa de uma terapia, o que você precisa é de uma foda.
A gente fodeu ontem.
Não de mim, da vida. Sua cretina.
Você não pode ter medo de minhas palavras. Quando eu disse que te amava, aquilo foi um sonho e eu tive que fazer dele uma realidade e agora, agora eu cansei. Cansei de ser sua mulherzinha, cansei de jurar amor e de olhar pra frente e ver somente isso. Eu, você, eu, você, eu, você. A eternidade é coisa de religião, eu não quero morrer nesse paraíso, nesse apartamento, olhando pra você e pensando...
Pensando que foi tudo um erro?
Arrependimento é coisa de gente babaca.
Pensando o quê?
Eu não posso ser sua, é isso.
Ela se sentou, acendeu um cigarro e deu uma tragada bem longa. Depois se levantou e como se fosse somente ume espírito foi embora, deixando um perfume de lavanda e tabaco. Mas antes de fechar a porta ainda pude ouvir:
Preciso parar de fumar também, se não for o tédio vai ser o cigarro que vai me matar.

Amor: Filosofia ou Suicídio?

23/04/2007

Vai, a vida não te merece.
Pois já te acompanha nas noites a vagar,
O tédio, amigo célebre.

Tão absurdo seria festejar
O morrer não tão calmo da beleza estéril
No fim da noite, no bar.

Aquele frio ibérico
Que dá quando se está só
Como a navalha ou o mistério.

Aquele fino pó
Que permeia a luz
Aquela nota em sol ou dó.

Já não faz sentido o que te conduz
Ou te conduzia
Porque neste fim não há luz.

E ao mesmo tempo, a vida
Bandida e sagaz
Te espreita na saída.

O Abismo da Tristeza

Hoje não me sinto triste nem melancólica, sinto-me apenas vazia de qualquer sentimento depressivo ou alegre. Nada, neste momento transformaria essa sensação em algo explicável. Seja como for sinto às vezes vontade de chorar, como se chorar abrisse um canal estancado no meu peito, se me aquieto e ouço os meus órgãos pulsarem vem junta essa vontade de me desabar para um centro como água que entra por um ralo e no momento seguinte volta. Esse movimento de expiração e inspiração que me toma quando paro, mas não penso, apenas paro para sentir tudo isso que não estou sentindo.

Ontem desabei, mas não soube porquê. No fundo tenho medo de perceber que de fato sei de tudo, tenho consciência da negritude que está tomando conta do meu interior, a ausência de luz de calor ,de algo que me consuma. Ontem abandonei-me a mim mesma, tornei-me mãe e filha de meu corpo pois não quero outros braços não quero outras explicações, quero somente a inércia, a placidez da água parada em um lago, a imobilidade de uma pequena estátua de jardim.

Não me obrigo a achar explicações para tudo, deve sempre haver uma reflexão sem a necessidade de um fim, de um ponto final. Refletir incessantemente pode levar-me a um estado de beatitude, desenrolar meu ser sobre o universo infinitamente até torna-me um ponto de luz, uma molécula sem começo nem fim. É este o meu objetivo agora, ser compactada afim de que a minha energia se aglomere e então eu possa reviver. Assim me sinto neste momento semente em estado latente, mas sem energia suficiente para florescer, por isso a inércia, por isso desabar-me, por isso apenas refletir, refletir e refletir.

Se houver uma explicação, se houver em algum momento um pouco de sanidade racional onde eu possa finalmente esclarecer-me, este momento não será agora. Pois adormeço por dentro e não estou sonhando.

Ensaio

Ana,

Eu não saberia te dizer qual é a verdadeira confusão que me devasta. Acho que tudo aconteceu naquela festa, quando o dia foi surgindo bem devagar compreendi que não estava mais livre, que nunca na verdade eu fui livre de nenhum destes pensamentos que agora te escrevo.

Quem veio primeiro, o amor ou o desejo? Quando olho nos seus olhos, a única luz que ainda tenho nestes meus dias, eu me perco profundamente nas suas pálpebras, nos seus cílios, nas suas entranhas. O tempo e o espaço se fundiram em uma fina linha e segue em direção ao infinito. Então quando penso no passado, um mar calmo e morno, penso que lá não existia opções, nem caminhos. A tranqüilidade é monocrômica, a tranqüilidade é um vasto verde, ou azul profundo, silencioso.

Na verdade, estou mentindo. Permita-me começar outra vez. Às vezes me perco demasiado dentro da licença poética.


***

Ana, querida Ana.

Por que aquela manhã foi tão diferente das outras? Eu sei, não deveria jamais começar uma frase com uma pergunta dessas. Mas ela se faz necessária para que eu possa continuar e para que você possa compreender todos os outros motivos desse meu afastamento da realidade.

Aquele foi o dia em que meu coração se libertou. Engraçado que eu consigo ver agora em seus lábios um pequeno sorriso. Pode rir Ana, a brancura de seus dentes é um conforto pra mim. Pois bem, meu coração não se libertou somente, mas ele quase parou. Te juro de pés juntos, que já chorei todas as lágrimas e que agora minha redação é pura análise.

Ah Ana, se você pudesse tocar com seus dedos o meu interior, ia sentir o espaço vazio que se criou. Um abismo dentro de mim. Estas palavras são muito grandes para explicar a sutileza.


***

Ana,


Há muito não sinto isso dentro de mim, e parece tão bom. Me olho no espelho e só vejo graça em meus gestos. Aquilo que está longe já quase não me pertence, já quase esqueci o que é aquele cheiro humano do sal e dos azeites corpóreos. Me olho no espelho e vejo duas pessoas, vejo um cânon, vejo aventura. Não, não estou amando, estou sentindo.