23/04/2007

Ensaio

Ana,

Eu não saberia te dizer qual é a verdadeira confusão que me devasta. Acho que tudo aconteceu naquela festa, quando o dia foi surgindo bem devagar compreendi que não estava mais livre, que nunca na verdade eu fui livre de nenhum destes pensamentos que agora te escrevo.

Quem veio primeiro, o amor ou o desejo? Quando olho nos seus olhos, a única luz que ainda tenho nestes meus dias, eu me perco profundamente nas suas pálpebras, nos seus cílios, nas suas entranhas. O tempo e o espaço se fundiram em uma fina linha e segue em direção ao infinito. Então quando penso no passado, um mar calmo e morno, penso que lá não existia opções, nem caminhos. A tranqüilidade é monocrômica, a tranqüilidade é um vasto verde, ou azul profundo, silencioso.

Na verdade, estou mentindo. Permita-me começar outra vez. Às vezes me perco demasiado dentro da licença poética.


***

Ana, querida Ana.

Por que aquela manhã foi tão diferente das outras? Eu sei, não deveria jamais começar uma frase com uma pergunta dessas. Mas ela se faz necessária para que eu possa continuar e para que você possa compreender todos os outros motivos desse meu afastamento da realidade.

Aquele foi o dia em que meu coração se libertou. Engraçado que eu consigo ver agora em seus lábios um pequeno sorriso. Pode rir Ana, a brancura de seus dentes é um conforto pra mim. Pois bem, meu coração não se libertou somente, mas ele quase parou. Te juro de pés juntos, que já chorei todas as lágrimas e que agora minha redação é pura análise.

Ah Ana, se você pudesse tocar com seus dedos o meu interior, ia sentir o espaço vazio que se criou. Um abismo dentro de mim. Estas palavras são muito grandes para explicar a sutileza.


***

Ana,


Há muito não sinto isso dentro de mim, e parece tão bom. Me olho no espelho e só vejo graça em meus gestos. Aquilo que está longe já quase não me pertence, já quase esqueci o que é aquele cheiro humano do sal e dos azeites corpóreos. Me olho no espelho e vejo duas pessoas, vejo um cânon, vejo aventura. Não, não estou amando, estou sentindo.

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