20/03/2006

Sala de Espera

Uma sala branca, com sofás nada confortáveis faz com que o silêncio paire de uma forma diferente, angustiante. Esse é o primeiro sentimento que bate: uma angustia fria com cheiro de éter e desinfetante. A principio a espera em uma sala médica nada tem de mais, com enfermeiras passando de lá pra cá a toda hora, soltando sorrisinhos educados e falando baixo pelos cantos: É neste momento que começo a sofrer, o sentimento passa de calmaria a confuso e fico sentada, suando nas mãos esperando sempre pelo pior.
Com o papel de exames nas mãos tenho que preencher um formulário que só serve para me irritar mais: gravidez recente? Não. Aborto? Não. Feridas externas? Não, não e não. Todas essas perguntas apertam meu peito e me lembro da condição humana que é tão pueril. Apesar de ser tudo muito limpo e desinfetado, clínicas e hospitais não deixam de exalar um cheiro medonho de doença e morte; micróbios flutuando no ar, todas as outras pessoas na sala têm a mesma cara de espera e medo, é quase uma tristeza que repuxa da testa até o queixo uma expressão infantil, nem o homem mais forte e competente do mundo sente-se seguro em uma sala de espera.
Srta M...Por favor, me acompanhe. É chegada a hora, eu sigo a enfermeira como um condenado à morte segue o carrasco até a guilhotina. Penso mais uma vez na situação degradante que é ser humano, que é ser vivo com validade, data de expiração. Penso em como uma fortaleza de vitaminas, músculos e ossos perfeitos pode sucumbir-se à força maior da lei da natureza: tudo o que começa um dia acaba. Enquanto tiro a roupa para o exame e ouço descontente as piadinhas das assistentes do médico, percebo que minha pressão vai caindo lentamente, de súbito me ataca uma depressão, minha testa se contraí gravemente, fecho os olhos, respiro fundo e sento para receber segundas ordens.
Srta M ponha os pés assim, isso. Agora se deite, relaxe. Como alguém pode relaxar ou até dormir (creio que os médico esperem de nós até um cochilinho) entre tantos instrumentos metálicos, iodos, ácidos e contrastes. Contraio a musculatura na medida em que a enfermeira pede para relaxar, o médico entra na sala e me faz um aceno como se eu fosse uma estátua, um pedaço de carne com um par de olhos, no caso úmidos e lacrimejantes devido ao nervoso. Por de trás de minha cabeça, ouço barulhinhos de plásticos que se rasgam, soro sendo aplicado em algodão. Fecho os olhos e solto um gemido franco: Vai doer? Claro que não, irei usar uma espátula e depois farei uma raspagenzinha com essa escovinha...- o diminutivo devia ser abolido da linguagem médica, assim como esse ar que eles tem de mentirosos, é claro que vai doer, e é claro que tudo que é inho na verdade é zão.
O pior sentimento que me abate nessas horas é o de impotência, sinto-me como uma criança sem pai nem mãe nessas horas, sendo bulinada por um estranho na rua, sendo invadida por instrumentos frios, texturas que somente posso sentir, mas não consigo ver. Tudo isso dói muito, exames invasivos, biopsias, na cara da enfermeira um tédio sobrenatural, meu olhar só acompanha a mão do médico e em seguida fixa-se em algum ponto no teto também branco. Srta M, agora colocarei um pouquinho de ácido, e você irá sentir uma cólicazinha...Isso...Muito bem, fique quietinha que estamos terminando. O momento final é drástico, começo a chorar compulsivamente, sinto o ardor entre as pernas me queimar a alma, sinto o medo que me assola de estar doente, de estar diferente, de quem sabe morrer até. Associo os piores pensamento à dor.
Quando acaba, sento-me na maca tremendo, tudo tão rápido e interminável, o médico me dá um copo de água, sai da sala sem falar nada, qume me acode é a enfermeira. Tudo bem queridinha? Ta vendo como foi rapidinho? Uhum, me resigno a responder. Ponho minha roupa e saio por onde entrei, lá fora rostos curiosos me olham, sinto-me nua e estuprada por todos eles. Vou embora cabisbaixa, fungando e tudo que há atrás de mim se reduz a uma cólica.

Nenhum comentário: