AUSÊNCIA: todo tipo de episódio que encena a ausência do objeto amado – sejam quais forem sua causa e duração – e tende a transformar essa ausência em provação de abandono
Estou indo embora. E se foi; sem causa direta e sem efeito nenhum de saída, não podia esperar mais nenhum dia, ou nem ao menos poderia esperar que pudessem os dois compreender o que estava se passando. Cansaço? Tédio? Não, tampouco foi a desilusão, quando foi embora deixou um bilhete na geladeira que eles – ironia do destino, compraram juntos.
Ela entrou em casa aquela tarde com as compras feitas do dia: macarrão, tomate, alho, óleo e um porta velas novo, daqueles que se pendura na janela do quarto, não imaginara (sabia que estavam por um fio) um bilhete na geladeira, jamais! Aquela noite jantou sozinha, não chorou, nem tentou procurá-lo no celular; não adiantaria mendigar sua atenção numa situação dessas. Não entraria em desespero por principio, ela que sempre prezou as atitudes austeras sabia que se perdesse o controle seria para sempre.
Relacionamentos modernos são assim, pensou. Foram dois anos juntos, desses dois anos poderia contar nos dedos quantos momento tiveram realmente juntos, não, não pensava que sairia à francesa numa quarta-feira. Tão efêmero, tão volátil, ele nunca realmente prestou atenção em suas atitudes altruístas. Ela nunca se importou em mostrar-lhe isso, e agora janta sozinha na pequena sala de jantar que se tornara imensa perto da solidão que estava sentindo. Não era saudades aquilo, era apenas ausência, de uma voz, de seus resmungos à noite na cama.
Conheceu ele num barzinho da Vila, tomando chope com as amigas, simpatizou, bebeu mais e foi para casa com ele. Em seis meses estavam morando juntos. Ausência, só isso, não tenho medo de ficar sozinha, mas tenho medo da ausência. É como o escuro que na definição é a ausência de luz, nada mais. Relacionamentos modernos são assim, ressalvou.
Mas não durou muito essa postura, quando começou o jornal nacional, ela entendeu que realmente foi abandonada, fora deixada de lado como um objeto que se esquece num banco da praça. Pegou no telefone mais de uma vez, não teve coragem. Deve estar com a outra, pensou, ou deve estar pensando em mim, consolou-se. Na verdade foi apenas mais um fim, como outros que virão em sua vidinha simples. Ele quem sabe pode voltar para sua vida, ela sabe que o amava, e ainda o ama, e por isso ainda dorme, encolhida, no seu lado da cama.
20/03/2006
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