Um dia ela me disse que Deus estava em todos os lugares, assim como o amor, que para os poetas é o grande Deus que rege o mundo. E enquanto que para os poetas, as palavras devem ser precisas, cada uma delas contendo a porção exata de compreensão, ela possui as suas próprias palavras que sussurra nos ouvidos dos anjos, quando quer falar com Deus.
Quando fala comigo, quando conversamos numa tarde qualquer, as suas palavras são as dos Homens. Uma boca cheia de verbos se abre e fecha, inúmera vezes, enchendo meus ouvidos. Pode-se dizer que existe uma ansiedade na sua fala sem pontos nem vírgulas, e que às vezes, desgovernadas ela ancoram com força e se espedaçam em cacos.Daí ela chora no chuveiro, aliviando sua alma, deixando escorrer pelo ralo uma angustia. A vontade que eu tenho é de dizer que não sofra, que o amor é uma coisa boba, nós poetas sabemos disso.
Outro dia recebi uma carta sua, falando sobre a chuva e sobre as lágrimas de Deus que caíram sobre seus ombros–ou foram sobre os meus?- e que provaram, dentro de tantas dúvidas, a sua presença. Não foi uma metáfora, porque a metáfora é vazia, é uma comparação entre duas coisas que parecem, mas não são. Quando sofremos não é metáfora, é dor física dentro do peito. Será que ela sofre? Será meu Deus?!
Imagino que ela olhou para cima e as lágrimas do céu caíram em suas janelas castanhas. Acho que na hora ela sorriu, deve ter sorrido espertamente. Abriu as mãos e de uma delas caiu uma caneta. Não precisava mais escrever aquele momento, não havia verbos em sua boca suficientes para decifrar o sentido do momento em que o ser humano é. Na plenitude do sentimento, ela me escreve outra carta contando o que aconteceu dentro dela naquele momento.
“Querida amiga, pergunto se a vida pensa em mim. Vocêpensa em mim?”
Eu sempre penso nela, como a vida poderia não pensar? A vida seria menor se não houvesse criado tal ser e se ele não tivesse um dia entrado pela porta da sala, rindo espertamente de tudo em volta, como se a piada já estivesse pronta.E eu acabo acreditando que onde ela está, Deus está. Porque o seu Deus anda sempre por perto, como um caderno de anotações, de inspirações.
E por fim, no meio disso tudo, chegamos sempre à mesma conclusão, entre uma garfada de macarrão e outra, entre uma risada e outra, que o seu Deus e o meu Amor são a mesma pessoa, que eu posso ficar tranqüila e acreditar que na dúvida existe sabedoria, existimos porque duvidamos, certo Lu? Certo, ela diria.
02/12/2008
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Um comentário:
adorei, no duro.
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